Leh Rodrigues

terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

A Ladeira (Hudson Alexandre Leh Rodrigues)


                                                


A Ladeira – Hudson Alexandre (Leh Rodrigues)


Estou aqui entre pensamentos incertos e uma ladeira implacável

Um bar escuro embriaga a vida,

No ir e vir de pessoas perdidas em busca de sentido e direção.

E cá estou corpo e coração.

Moças deselegantes conversam despretensões diárias.

Velhos sonhadores se debatem em filosofias domésticas.

E eu invisível acompanho tudo, sem muita relevância nem aprendizado.

Dia após dia o mesmo vai e vem de carros e passos apressados.

E aquele bar escuro, reduto de homens em busca de muletas,

Buscando sufocar a agonia de mais um dia que se vai

Não há quinto dia nem salário que baste ou

Dê sentido nesses corações encerrados em quatro paredes,

Enterrados a sete palmos de suas ansiedades e medos.

Descem pela vida como um caminhão sem freio,

Por essa ladeira cruel que margeia o tempo sem fim.

O céu azul está salpicado de chumbo,

Parcialmente encoberto de árvores sedentas de água.

E as casas dessa ladeira escondem as angústias cotidianas,

De doenças cotidianas, de mentes balzaquianas.

O sol é tímido, mas arde na pele.

As aves se perdem no ar, como morcego sem radar,

Como alguém que perdeu o instinto materno,

Como aventureiro sem bússola.

Na ladeira, a subida é difícil!

As dores do corpo realçam,

O semblante de um dia duro e exaustivo de uma mulher

E quando ela entra pelo portão do seu refúgio,

Começa a segunda parte de uma rotina viciante.

E a vida gira como roda gigante,

Mas não como a mesma graça e leveza de suas lembranças de menina.

Mas é preciso acordar do sonho, das saudades.

O passado é só uma bobagem nostálgica,

Que passa inconsequente pela sua mente,

E mente, mente até que ela se convence que realmente passou pra nunca mais.

O dia é quente,

Talvez trinta e cinco graus de um mormaço que perturba a tez.

E o bêbado sentado na calçada,

Com a cabeça baixa e zonza pensa em como seria a vida se ele não estivesse ali, Naquele momento.

Seus trejeitos afeminados e alegres,

Como os gestos de um louco suspeitam os transeuntes,

Que o fitam num misto de medo e pena.

E agora ele se levanta e sobe a ladeira no seu passo trôpego e lento.

Vai subindo e sumindo, enquanto a esquina o engole todo,

Do mesmo jeito que ele engoliu o contéudo inebriante de seu copo de angústia.



Há no pé da ladeira um córrego ladeado de pequenos arbustos,

Como crianças ladeiam ambiciosamente os adultos.

O fluxo de sua corrente impura rola devagar,

Enquanto vidas vadias olham para o nada,

Para os carros que descem a ladeira sem pretensões de destino.

Rodas deslizam ladeira abaixo,

No mesmo tempo que passos tristes caminham devagar,

Tentando frear o tempo refletido nas marcas de um dia sem brilho,

Nas velozes asas da vida.

No dia seguinte estarei no lado inverso da ladeira.

Encimado no orgulho e soberbia alegre,

De quem parece não ter uma rotina maçante.

Uma pomba voa com o voo da paz,

Sob uma inquietação adolescente que paira no ar.

Sinais e setas indicam o vai e vem de caminhos sem volta.

O vento se fez perceber,

Pelos cabelos que perturbam meu olhar,

Pelo balanço dos galhos,

Pela danças das nuvens que em figuras imaginárias enganam meus olhos.

E eu continuo invisível a esperar o ônibus,

Que irá me tirar dessas realidades alheias,

E irá me levar para casa, onde alguém espera ansiosa a minha volta,

Para me abraçar, me beijar e perguntar como foi o meu dia.

E eu distante dessas sagas cotidianas,

Continuarei a imaginar essas pessoas e,

Carros passando displicentemente por essa ladeira,

Que eu chamo de vida.




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